1001 Liberdades
POR: FÁTIMA ABREU
2016
E um sonho pode ser verdadeiro, se acreditarmos com força...
CAPT 1
Naquela tarde ela não apareceria. Não que estivesse fazendo falta, ele pensou...
Na verdade, fazia sim! Por onde andaria? Talvez pelas ruas do tumultuado centro carioca.
Poderia estar na SAARA, o que combinava bem com seu nome: Sherazade!
Tal qual a personagem das "1001 Noites", ela não só recebera o nome, como a capacidade de imaginar aventuras, e contá-las muito bem.
Foi por isso, que ele a aceitou, como quase dizia-se "comprado" da família, em paga de uma dívida.
O interior não é muito diferente em termos de pessoas passando necessidades, como nos centros urbanos.
Todo lugar do mundo tem, na verdade, em maior ou menor grau, conforme a região.
Seu Augusto era um caseiro do sítio "BOM PASSEIO".
Tinha oito filhos nascidos e criados ali, com sua esposa Aracy.
A quitanda e mercearia de secos e molhados vendia fiado para os caseiros da região. Eles pagavam no dia que recebessem o salário.
O árabe Xariar era dono de quase todo comércio daquele lugar: Desde pequenas "vendas"(como chamavam por aquelas paragens), até rede de mercados varejistas.
Sírios e libaneses fizeram daqui sua nova morada, com o início da imigração árabe para o Brasil, pelos idos de 1912.
Ao contrário de outros tipos de imigrantes que trabalhavam diretamente na agricultura, os "turcos" como eram chamados, vinham para trabalhar como mascates e depois, progrediam e montavam seu próprio comércio.
Muitos lugares afastados dos grandes centros urbanos, tinham nos turcos, uma fonte de contato com as notícias do mundo lá fora: Eles traziam informações e aproveitando o bom papo, acabavam vendendo mais...
Xariar era de uma família imigrante, já nasceu aqui, embora criado com toda tradição árabe.
Os primeiros imigrantes eram árabes católicos maronitas. Bem diferente da leva mais atual, quando a maioria é islâmica e uma minoria judaica.
O pai de Xariar, veio como mascate, prosperou seu negócio e deixou uma vasta rede comercial para que o único filho cuidasse de tudo.
E rapidamente aumentou mais... Era um bom administrador, estava na veia!
Seu Augusto estava endividado até a raiz dos cabelos com todo comércio do local:
Também com oito filhos, ele e a esposa para alimentar, vestir, calçar, remédios quando ficavam doentes, e tudo mais...
A situação ficou pior quando sua esposa adoeceu e precisava ir para o Rio de Janeiro se tratar, fazer exames, pois, também apresentava traços de doença parkinsoniana.
Pediu a Xariar que saldasse sua dívida, e pagasse também as passagens rodoviárias. Em troca, faria o que ele quisesse.
Xariar era viúvo já havia três anos. Jovem ainda, tinha seus 38 anos quando ele mesmo matou a esposa, pega em adultério com seu motorista.
Conseguira se safar de ser preso, pois tinha ótimos advogados e disse no depoimento que armaram para matá-lo: Para que ela ficasse como única herdeira de suas posses.
Então, em "legítima defesa", depois de uma luta, quando os pegaram nus na sua cama, sacou da arma que trazia sempre consigo, e matou os amantes.
Xariar então, depois de se livrar disso, perdeu toda credibilidade que tinha nas mulheres, até desprezando-as, e as usando somente como objetos de seus insanos desejos sexuais...
Cada noite dormia com uma, tornara-se obsceno.
Para ele, mulheres só para seu prazer e para nada mais serviam.
Suas funcionárias eram as escolhidas para sua cama, e no dia seguinte, as despedia sem piedade...
E tornava a contratar tantas outras para repor as retiradas da função.
Xariar não sabia em quê poderia seu Augusto lhe servir. Deixou então ao seu encargo, uma sugestão do que faria, para o dia seguinte que tudo fosse resolvido.
Seu Augusto aceitou, e saiu do escritório de Xariar com um cheque na mão.
Não só cobria suas dívidas, como garantia passagens e hospedagem em algum hotel mais barato do Rio de Janeiro, por pelo menos uma semana, tempo suficiente para que sua esposa fizesse todos os exames e começasse com os remédios.
Quando Augusto chegando a casa, contou a toda família sobre o impasse de não saber em quê poderia servir a Xariar, já que em toda sua vida fora caseiro de sítio, pois, nem o ensino fundamental tinha terminado, a sua filha Sherazade, uma jovenzinha muito esperta e atenta a tudo que acontecia naquele lugar, disse então:
- Papai, e se em lugar do senhor trabalhar para esse homem tão poderoso e malvado, pois despede suas funcionárias sem dó nenhum das coitadinhas, deixar que eu trabalhe para ele? Afinal, tenho mais estudo que o senhor, terminei o secundário agora. Poderei trabalhar em um dos escritórios como recepcionista ou auxiliar mesmo, sem que ele me pague nada, pois será a sua paga e não a dele.
- Filha, sua intenção é boa, mas... Como você mesma disse, ele logo te mandaria embora, e eu continuaria a dever o favor...
- Ah, mas sou esperta papai! Tenho umas ideias aqui na minha cabecinha, que se der certo, ele não irá me despedir!
A conversa se estendeu por quase toda noite, e já estava dando 23 hs quando todos foram dormir.
Uma coisa havia ficado comprovada para seu pai:
Sherazade tinha um grande poder de persuasão...
Fátima Fatuquinha Abreu
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