quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Um Conto de Tempo & Areia ( vol 2 )- REPUBLICADO





Livro IMPRESSO nesse link do CDA:
https://www.clubedeautores.com.br/…/180598--Um_Conto_de_Tem…

Sinopse
A continuação de UM CONTO DE AREIA & MAR *: Romance de época que vai desde a BELLE ÉPOQUE, até a Segunda Grande Guerra. As personagens fictícias encontram-se com personalidades históricas como Mata Hari e Coco Chanel, entre outras. Um romance suave e poético como a brisa marinha...
Categorias: Ética E Filosofia Moral, Metafísica, Livre Arbŕtrio & Determinismo, Poesia, Filosofia, Ficção e Romance

* Um livro que independente de se ter lido o volume 1: 
Tudo é entendido pela introdução.





INTRODUÇÃO:

Gaston Verne continuava internado no sanatório para onde foi levado após atirar em seu tio em março de 1886... Contava 48 anos agora. Havia já se passado 22 anos, desde o acontecido.
Até então, não sabia da existência de seu filho com Irina.

Julio Verne ficou coxo por um dos tiros que recebeu, por 19 anos até sua morte.
Não chegou a assistir ao  Grande conflito mundial, pois havia falecido por diabetes, em março de 1905, na cidade de Amiens, França.
Agora fazia 3 anos de sua morte

O ano era 1908:
Irina seguia  a vida com seu atelier de costura, onde seu filho era gerente:
Já era maior de 21 anos. Irina passou a gerência para ele, ficando apenas com a criação e produção dos vestidos  e chapéus.

Irina era uma  senhora de 38 para 39 anos agora, mas, permanecia com o frescor da juventude, sem cabelos brancos ou rugas.
Não havia quem lhe desse essa idade, aparentava tranquilamente ter 10 anos a  menos.

Despertou então o interesse de um advogado viúvo: Monsieur Gerard Michel Leon.
Irina morava na mesma cidade que ele: Nantes, desde que voltou de Paris (quando soube estar grávida, um mês depois de seu retorno ao litoral)...

Indicaram o atelier de Irina para que ele levasse sua única filha Lídia, recém chegada de Paris (onde esteve desde a morte de sua mãe), para fazer um novo vestuário. Teria de ser mais adequado ao clima do litoral e menos sofisticado do que na capital.
Resultado:  Gerard apaixonou-se à primeira vista por Irina.
Ficou encantado com tanta leveza, em uma dama moradora do litoral.
Esperava encontrar ali, uma senhora grisalha de seus 60 anos e rabugenta (assim era a maioria das proprietárias de Casas de Alta Costura em Paris)... 






Como se enganou! Estava ali a sua frente, uma criatura  de traços suaves, cabelos lustrosos, muito bem educada e sorridente...




                       1

O vento batia nas folhas das poucas árvores que havia na orla.
Irina sempre repetia o mesmo passeio matinal, antes de começar mais um dia em seu atelier...
E ali, sentada em uma pedra, inspirava profundamente o ar marinho.  
Gostava disso, cheiro de  maresia...
Seu filho interrompeu suas divagações pousando a mão sobre seu ombro:

- Assustei-a mãe?
- Não meu filho, só me pegou distraída... Quer alguma coisa?
- Sim, mãe. Aproveitando a brisa fresca da manhã, quero saber algo que não achava adequado perguntar até minha maioridade... Quem é meu pai?
- Sabia que um dia iria me fazer essa pergunta. Pois bem, chegou mesmo a hora, pois já é adulto. Seu pai chama-se Gaston Verne, sobrinho do falecido escritor Julio Verne.
- E por que nunca veio nos visitar? Não me lembro se quer, de chegar uma carta todos esses anos...
- Filho, seu pai está internado em um sanatório desde que atirou no tio. Ninguém soube até hoje, porque ele fez tamanha asneira! Fato é que deixou Julio Verne coxo, até sua morte...
- Meu pai não vai sair do sanatório? Ficará internado até que morra?
- Temo que sim... O juiz foi implacável em dizer que Gaston era perigoso, por ser louco.
- Mãe, quero conhecer meu pai. Mereço isso. E se ele morre e nunca nos vimos? Não, isso para mim seria terrível! Temos que ir até esse sanatório...
- Certo, faremos essa visita a seu pai. Dentro de uma semana prepararei tudo. Agora vamos que a vida chama...

Irina saiu de braço dado ao filho, com os pensamentos em turbilhão: 

Depois de 22 anos, reencontrar Gaston em um manicômio, não era bem o que ela queria...
Entretanto, sabia que devia isso aos dois, pai e filho...

                                     

                        2

A semana passou rapidamente. Irina e seu filho estavam prontos para a viagem. Um coche foi chamado para levá-los até  a capital e depois, rumo ao sanatório.

O clima mudava, e um vento frio de final de outono, gelava o rosto de Irina.
A viagem agora era menos longa, pois as estradas melhoraram muito, desde a sua primeira ida à Paris...
Durante o trajeto Irina pensava naquele senhor que havia conhecido um mês antes... Engraçado é que tinha o mesmo nome que dera a seu filho: Gerard.
Uma coisa aprendera durante todos aqueles anos: Coincidências não existem, e sim, artimanhas do destino...
 Será que aquele senhor tão atraente, havia cruzado seu caminho com algum objetivo, pelas esferas superiores? Só o tempo diria isso... Por enquanto, trataria de resolver o problema de seu filho.
Entretanto, deu um sorriso largo, ao lembrar-se do dia em que conheceu o advogado viúvo:

_ Boa tarde, senhora Irina! Sou Gerard Michel Leon. Alguns amigos aqui de Nantes, recomendaram sua casa de costura. Trouxe a minha filha Lídia, para que tome as medidas e lhe faça novo vestuário, adequado ao clima do litoral...
- Oh, certamente... Será um prazer. Venha por aqui jovem Lídia... Ah, meu filho cuida da administração do atelier. Ele lhe mostrará a  tabela de preços.

Tocou um sininho para chamar o filho que estava fazendo a contabilidade no escritório. Ele veio imediatamente, e Irina fez  a apresentação:

- Esse é meu filho Gerard...
- Muito prazer. Bem, então temos o mesmo nome?
- Ah, monsieur chama-se Gerard também? De certo tem um segundo nome...
- Sim, o meu segundo nome é Michel.
- Então não se incomodará que o chame dessa forma, pois não? É que me sinto estranho, a chamar alguém pelo mesmo nome que eu...
- Não por isso... Fique à vontade para me chamar de Michel. Bem, agora, por favor, a tabela de preços...
- Agora mesmo!

Enquanto os homens tratavam do dinheiro, as mulheres já estavam na sala de costura:
Lídia escolhia modelos de vestidos e chapéus e Irina anotava suas medidas.
Foi uma tarde bem agradável: Um chá com biscoitos amanteigados de nata foi servido para os novos clientes. E a conversa seguia longa...
A troca de olhares cativantes era inevitável:
O advogado G.Michel, não media elogios para Irina, assim como Gerard fazia gracejos à jovem Lídia...
Todos muito sorridentes e percebia-se que aquele momento passava de relações comerciais...


                        3

O sanatório era bem arborizado e habitado por muitos pássaros no seu entorno. Via-se uma briga entre um mentalmente desequilibrado, e um enfermeiro que tentava colocar-lhe uma vestimenta adequada aos loucos.
Irina e seu filho  preferiam ignorar aquela cena, olhando as pessoas que vagavam pelo vasto campo, dos arredores da ‘casa de repouso’...
Uma senhora veio lhes receber:
- Boa tarde! Em que posso lhes ser útil?
Irina disse então:

- Gostaríamos de poder falar com o senhor Gaston Verne, por obséquio.
- Ah, bem, terão que preencher uma pequena ficha de visita, antes disso. Por aqui...
Gerard respondeu:

-  Ele está bem de saúde? Digo, talvez menos desequilibrado, depois de tantos anos internado...
- Oh, na verdade ele nunca me pareceu doido. Mas,  se está aqui, é porque cometeu alguma loucura. Venham...

Gerard e Irina seguiram a senhora que lhes servia de cicerone naquele local. Adentraram  o recinto de paredes brancas e teto verde água. Um cheiro de “limpeza” era notado assim que se passava pelo corredor.
Pararam frente a uma porta que tinha um pequeno balcão de recepção. Ali assinaram o livro de visitas onde colocaram seus nomes e a hora da chegada.
A senhora disse então, apontando:

- Bem, agora podem seguir o restante do corredor e sigam até encontrar o número 28, que é o aposento onde Gaston Verne se encontra.
- Muito obrigada.
Gerard, que até aquele momento parecia tranquilo, ao chegar ao quarto 28, começou a suar gelado nas mãos...
Irina percebendo que o filho estava tenso, disse:

- Calma, meu filho. Gaston nunca foi mau. O fato de ele ter atirado no tio, foi uma insensatez que tenho certeza, foi momentânea... O problema é que o juiz achou que ele fosse louco. Dentro de mim. Sei que não o é. Vamos entrar...

Gerard bateu levemente na porta e girou a maçaneta, passando sua mãe à frente...
Um homem abatido, com algumas pequenas rugas na face, cabelos e barba aparados, olhava para o lado de fora da janela.
Assim que  percebeu a presença de alguém, virou-se e reconheceu Irina de imediato!  Não sabia quem era seu acompanhante. Mas, ao olhar bem para o rapaz de olhos marejados, percebia alguma semelhança com ele mesmo na juventude...
Pensou  que seria mais uma loucura sua, com certeza...

Irina tomou a frente e abraçou-o com todo fervor por todos os anos que não o via... Gaston então, disse visivelmente emocionado:

- Minha doce Irina! Quantos anos desejei que viesse me visitar! Neste lugar enlouquecia mesmo era de tanta paixão e saudade! Por que nunca veio?
- Gaston, perdoe-me essa longa ausência... De início, fiquei sabendo que me encontrava grávida. Não poderia viajar nesse estado...
Depois meu filho, quer dizer, nosso filho, nasceu, e dedicava-me a cuidar dele e de nosso sustento. Trabalhava muito, virando as noites nas costuras, e inventando modelos novos. O tempo foi passando, e decidi que só falaria da sua existência, caso Gerard quisesse conhecer o pai... 
Bem, e aqui estamos. Ele quis saber. 
Nunca deixei de lembrar de você, meu único e grande amigo, pois também foi o único a me tocar e plantar um filho abençoado...
Novamente abraçaram-se. O abraço do casal uniu-se ao do filho emocionado...
E assim, ficaram por minutos: Um único choro, misto de alegria, saudade e tristeza...
Depois, Gaston pegou a mão de Irina e a levou para sentar-se na cadeira que ficava ao lado de sua cama.  Virou-se para o filho dizendo:

- Depois de tantos anos de reclusão e tristeza, finalmente tenho uma boa notícia para me dar total alegria: Um filho! Ah, como gostaria de ter visto sua mãe a te dar a luz! E assistir aos seus primeiros sorrisos, a falar, andar... A vida me privou de tudo isso... Mas, aqui está você! Agradeço aos céus essa chance, antes do dia derradeiro!
- Não fale assim meu pai. Tudo tem hora certa para acontecer.  Ainda viverá alguns anos, com certeza. Virei aqui sempre que puder para visitá-lo. E se mamãe quiser virá também...

Gaston segurando a mão de Irina, disse quase implorando:

- Por favor, Irina, venha sempre acompanhando nosso filho...
- Não posso prometer que virei sempre Gaston... Mas, sim, quando possível. O atelier toma muito meu tempo. Agora mesmo, deixei duas costureiras abarrotadas de encomendas para vir te visitar...
- Está certo, entendo sua posição. Mas, me contem tudo que deixei de saber sobre vocês...
A conversa estendeu-se por 3 longas horas, e entre risos e lamentos, parecia realmente uma família.



                      4

O retorno para Nantes foi no dia seguinte. Irina e Gerard dormiram numa estalagem perto do sanatório. Pela manhã, ainda fizeram mais uma visita à Gaston, antes da partida.
Gaston pediu com a voz embargada e olhos carregados de lágrimas:

- Não deixem de voltar, por favor. Assim a  minha pena aqui, se tornará mais leve. Antes minha vida estava apagada. Agora tenho pelo que ansiar...
Irina segurou as duas mãos de Gaston respondendo:
- Sempre que pudermos meu amigo. Fique bem.

Gaston beijou a testa e as mãos de Irina e em seguida, ao filho deu forte abraço, com uma boa batida nas costas... Era assim que os homens se felicitavam.
O coche chegou e Gerard ajudou sua mãe a subir com a pequena bagagem que levaram. Em seguida, acenaram para Gaston, com lágrimas nos olhos. 
Ele acenava também, observando a carruagem sumir  pelos portões  e ganhar a estrada...



A noite já estava alta, quando Irina e Gerard ouviram alguém bater na porta do atelier.
Estranharam porque visitas depois das 22:00 hs não eram comuns. Gerard disse já caminhando para abrir:

- Fique aí sentada mãe, vou ver do que se trata.
Abriu a porta e deu com o advogado  G.Michel desesperado:

- Por favor, esse é o último lugar para procurar, já fui a todos os lugares possíveis!
Sem entender do que o homem falava, Gerard abriu caminho para que ele entrasse.
- Diga quem ou o que, está procurando, meu amigo?
- Lídia! Está sumida desde o início da tarde de hoje!
- Como  pode ser isso? Lídia sempre sai acompanhada!
- Sim, quando não está comigo, sai com a nossa governanta... Mas, hoje ela simplesmente sumiu dos olhos de madame Gertrudes! Quando foram ao mercado escolher frutas e legumes, Lídia distanciou-se um pouco, para olhar os animais à venda. Gosta muito de coelhos... Bem, entretida com as compras, madame Gertrudes não reparou quando ela sumiu... Agora estamos loucos, batendo de porta em porta, perguntando se alguém a viu ou tem alguma pista...

Irina escutando a conversa levantou-se dizendo:

- Meu Deus! O que terá acontecido com a jovem Lídia? Ainda a vi hoje, passando embaixo de minha janela, com a governanta. Sim, tomavam o rumo do mercado... Ninguém a viu depois disso?

- Ah, madame Irina, nada! Parece que minha Lídia sumiu no ar! Como lembrei que ela tem muito apreço por vocês, pensei até que tivesse vindo fazer uma visita e ficou até mais tarde... Pena, não foi isso que aconteceu! Não sei mais onde procurar.

Gerard então disse tentando acalmar o homem:

- Tente imaginar tudo que pode ter acontecido: Será que ela foi raptada, ou embrenhou-se pela estrada passeando sozinha e não soube voltar?
- Não, Lídia não teria esse tipo de atitude, porque sempre avisa para nossa governanta aonde quer ir... Sim, a primeira opção  é mais provável: Que ela tenha sido raptada...
- Nesse caso, já falou com as autoridades?
- Sim, eles estão cientes e procuram por pistas. Mas eu não quero ficar de mãos atadas esperando... Procuro também.
Irina disse vacilante:

- Quem sabe Lídia tenha um amor escondido e resolveu ir embora com ele?

- Nosso diálogo é aberto, porque ela só tem a mim. Se fosse esse o caso, ela teria  me falado de alguém e pediria permissão para trazê-lo em casa. E falemos a verdade: Lídia mostra apenas interesse em Gerard...

 Gerard entusiasmou-se com esse comentário. Ele também só tinha olhos para Lídia.
Pensava já em pedir ao advogado para cortejar sua filha... Mas, e agora, com a moça desaparecida?
Irina então falou já com a sua intuição aguçada:

- Bem, então resta procurar pelas casas abandonadas da praia... Pode ser que a tenham levado para uma delas.  Tem pelo menos quatro casas que foram deixadas pelo povo que foi para outras cidades...
- Bem lembrado mãe! Sim, se Lídia foi raptada, não a levariam para longe... Teriam de ficar próximos, para pedir resgate.

O advogado  concordou:
- É estão raciocinando melhor que eu... Agora a noite já vai alta. Eles devem até estar dormindo. Entretanto, deve ter algum bandido de vigia...
- Cuidar de um, é mais fácil que de vários! Vamos?

Irina ficou preocupada com a coragem do filho, de sair  para enfrentar com G.Michel, os bandidos e resgatar a jovem donzela.
Talvez ele estivesse mesmo apaixonado por Lídia. Só isso explicava sua atitude... 
Não poderia segurar o filho em casa, se ele já estava decidido... Pediria para que Deus cuidasse dele e de Michel, trazendo-os sãos e salvos com Lídia.
Quando acabou de pensar isso, ouviu somente a voz do filho dizendo:

- Estamos indo, mãe. Reze para que tudo dê certo. Vamos passar antes na casa de monsieur Michel, para pegarmos  duas armas. Um precisa dar cobertura ao outro.
- Que Deus os abençoe, os leve e traga bem, juntamente com a jovem Lídia.
- Amém.

Responderam os dois homens ao mesmo tempo.

Continua no livro...

Fátima Abreu

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